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Morre aos 78 anos o Professor Carlos Daghlian

Posted on 17. set, 2016 by .

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[caption id="" align="alignnone" width="252"] Professor Carlos Daghlian, na ocasião do recebimento do título de professor emérito da UNESP[/caption]

 

É com profundo pesar que a diretoria da ABRAPUI informa o falecimento do professor Carlos Daghlian.

Professor Titular aposentado do Departamento de Letras Modernas do Ibilce e Professor Emérito do Instituto, Daghlian faleceu nesta sexta-feira, aos 78 anos. O docente era casado com dona Elza, e deixa a filha Elza Sueli.

Bacharel e Licenciado em Letras Anglo-Germânicas (1962) pela Universidade de São Paulo (USP), Master of Arts (1965) pela Pepperdine University de Los Angeles, Doutor em Letras (1972) pela Universidade de São Paulo (USP), Livre-Docente (1987) e Titular (1993) pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), ministrou aulas de Literatura Norte-Americana para os cursos de graduação de 1967 a 2003 e, para a pós-graduação, Teoria da Literatura, de 1979 a 2006.

Presidente emérito da Associação Brasileira de Professores Universitários de Inglês da Associação Brasileira de Professores Universitários de Inglês (ABRAPUI), Daghlian era autor dos livros Emily Dickinson: A Visão Irônica do Mundo (São José do Rio Preto: Vitrine Literária, 2016); As técnicas de persuasão em Moby Dick (São José do Rio Preto: Vitrine Literária, 2013) e Os Discursos Americanos de Joaquim Nabuco (Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1988); organizador do livro Poesia e Música (São Paulo: Perspectiva, 1985); publicou capítulos de livros e artigos em periódicos especializados sobre Edgard Allan Poe, Herman Melville, Emily Dickinson, entre outros, no Brasil e no exterior. Desde 2009 era membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura.

Descendente de armênios, “filho de […] Leon e Huripsime Daghlian, sobreviventes do massacre que os turcos impetraram aos armênios à época da Primeira Grande Guerra, por volta de 1915, quando mais de um milhão de armênios perderam a vida”, o professor Daghlian era um homem disposto a ensinar sobre tolerância em um mundo repleto de ódio. Em 2015, nas celebrações que marcaram os 100 anos do genocídio perpetrado pela Turquia ao povo armênio, o docente contribuiu com a Revista Unesp Ciência (ed. 65) com o artigo “Um genocídio quase esquecido”. Antes disso, em 2009, ao receber o título de Professor Emérito da Unesp/Rio Preto, emocionou a todos ao narrar a saga de seus ancestrais, vítimas do genocídio armênio, ocasião em que proferiu as seguintes palavras:

“Meus avós paternos, com duas filhas moças, dois filhos pré-adolescentes e o filho caçula, que tinha um ano e meio, foram repentinamente arrancados de suas propriedades e conduzidos por soldados turcos, juntamente com milhares de armênios, nus e indefesos, ao deserto de Deir-Ez-Zor, situado em território sírio. O menino caçula foi colocado nas costas do pré-adolescente mais velho, que tinha treze anos. De meus avós, não tivemos mais notícias e, de meu avô, não temos sequer uma foto. De suas filhas, alguns sobreviventes que conseguiram fugir do deserto informaram que as viram sendo mortas a machadadas e lançadas nas águas do Rio Eufrates. O filho caçula, chorando desesperadamente e pedindo água e comida, que ninguém podia lhe dar, acabou sendo abandonado no deserto, onde teve a sorte de quase todos os deportados que ali morreram. Os dois pré-adolescentes, tio Benjamin e tio Loutfy, exaustos, foram recolhidos por beduínos curdos que viviam às margens do Eufrates. […] Tio Benjamin faleceu de repente na noite do dia 24 de abril de 1965, um sábado, justamente no dia em que a numerosa comunidade armênia de Los Angeles, como as de todo o mundo, lembrava o genocídio ocorrido havia cinquenta anos. Nesse dia, eu e minha tia não ligamos o rádio nem a televisão, porque ele se mostrava muito tenso. Com certeza, ele se lembrava do irmão caçula que teve de abandonar no deserto. É claro que ele não teve culpa e, se tentasse ajudar o irmão, o que não tinha como fazer, teria morrido ali também. Mas, como podem imaginar, não é fácil para um ser humano sensível conviver com uma lembrança dessas. Minha tia me contou que muitas vezes ele acordava à noite chamando pelo irmão. Na manhã do domingo, dia 25, levantei-me e fui até a cozinha, onde minha tia preparava o café. Estranhei a ausência do meu tio, ele que era sempre o primeiro a se levantar. Minha tia pediu que eu o chamasse, mas eu disse que o deixasse dormir mais um pouco, já que sempre se levantava cedo. Quando, por insistência dela, fui chamá-lo, ele estava gelado e com o semblante sereno. Minha tia, já preocupada, também foi ao quarto e, quando percebeu que ele estava morto, já chorando, ela me disse: “ele encontrou o irmão”.

Nessa despedida, a comunidade acadêmica irá lembrar de uma das características mais marcantes do professor Carlos Daghlian, seja para seus pares acadêmicos, seja para alunos e servidores técnico-administrativos: a solicitude. Com gentileza e cordialidade, o professor Daghlian sempre esteve disposto a contribuir com aquilo que lhe era solicitado; estava sempre disposto a ensinar, não apenas em sala de aula, não apenas sobre as cátedras que lhe competiam.

A diretoria da ABRAPUI une-se em pesar a todos os que conviveram com o professor Carlos.

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